quinta-feira, 7 de junho de 2012

CODEC do Mác - Gays, Maslow, Drogas e Casamentos




Aqui em casa sempre tive muito acesso a leitura, minha mãe é pedagoga e sempre me acompanhou na minha alfabetização. Desde pequeno, muitos mitos e dogmas eram apresentados a mim como coisas naturais, assim como sexualidade. Ao mesmo tempo em que eu tinha alguns livros contando a história do patinho feio, eu também tinha um manual encadernado para crianças sobre sexualidade. O porquê deu ter um negocinho no meio das pernas e a menina não. Da onde vêm as crianças? Porque é que as coisas são assim?

Lembro até hoje de uma das minhas primeiras HQ’s. Era o Lanterna Verde, na época Kyle Rayner em suas primeiras páginas lia uma versão do Senhor dos Anéis, que pouco tempo depois, também influenciou toda a minha adolescência e o restante da minha vida. O mais engraçado, é que o Lanterna iria se tornar o herói que eu mais gostava, que eu mais acompanhei.


Durante o lançamento do Noite mais Densa, eu acompanhei quadrinho por quadrinho, era uma edição que não durava mais de 15 minutos em minhas mãos. Todo aquele universo, o fato dele ser provavelmente o herói com a arma mais poderosa em mãos, além do juramento ser algo que me arrepia até hoje, só em ouvir.




Mas, são poucas as pessoas que realmente conhecem e entendem o universo do Lanterna Verde. Não gente, o Ryan Reynolds não vai ser gay no próximo filme (se é que vai ter um próximo filme), e todo o universo DC foi rebootado, ou seja, começou tudo de novo. Novas histórias, novos conceitos, em todos os 52 títulos do universo Detective Comics.  Mas antes de começarmos a debater sobre esse novo ponto, preciso contar a história do Green Lantern e como é que ele já foi utilizado, como ferramenta da DC comics para mudanças sociais.




A primeira aparição, do então Lanterna Verde que mais se parecia com o Alladin, foi em julho de 1940, na edição número #16 da All American Comics. Alan Scott era um engenheiro de trens, que durante um acidente acabou encontrando uma lâmpada mágica que lhe deu os poderes da Lanterna. Até ai, nada de ET’s, Lantern’s Corps e nada do gênero. Tanto é que acabaram engavetando o Scott, pra voltar a aparecer quase vinte anos depois, na Showcase #22. Dessa vez é o Hal Jordan, piloto de testes, que encontra Abin Sur, responsável pelo setor 2814, que próximo do seu leito de morte dá a ele o anel com todo o poder do universo, fazendo com que Jordan se tornasse o protetor da terra.


O tempo foi passando e a DC começou a perceber, que os quadrinhos não eram somente uma forma de entretenimento, poderiam ter uma mensagem um pouco mais séria e pesada sobre as coisas. Ai então que sob o comando de Danny O’Neil e Neal Adams, o Arqueiro Verde se juntou ao Lanterna e os dois saem pela América enfrentando drogados, prostituição, homicídios e tantos outros crimes da vida real. Uma das capas mais famosas, desse amadurecimento dos quadrinhos, é exatamente a edição número #85, onde Hal Jordan mostra ao Arqueiro, que o seu sidekick é um viciado em heroína.



Duas edições depois, na #87, O’Neil e Adams atacavam novamente, dessa vez quem aparecia era o primeiro Super Heroi negro, que não tivesse o negro/preto em seu nome, John Stewart surgia para ajudar já que Jordan e Guy Gardner não estavam aptos para o serviço.



Mas dai você me pergunta. “Ok, você contou a história do Lanterna por que?”

A DC revida novamente e nos apresenta um novo Alan Scott, dessa vez sem a mitologia dos anéis, sem Jade, mas homossexual.



“Mas e dai? Já tinham personagens homossexuais antes, tipo o Estrela Polar! Tanto é que ele tá se casando..”

É exatamente ai que entra a história, o Estrela Polar sempre foi um super herói assumidamente gay. Mas era secundário, não tinha essa legião de fãs, muito menos esse papel importante para a cultura pop. Nenhum deles teve um filme (mesmo que uma merda, mas é um filme), ou sagas tão grandes e importantes para o universo DC.

Todos perguntam, mas por que um personagem homossexual?


No vídeo a cima, em uma das passagens um dos entrevistados diz que foi muito complicado para que ele se assumisse, devido a falta de modelos que ele se sentisse bem para seguir, que não fosse esses modelos alegóricos que estamos acostumados a ver em TV e Cinema. Um homossexual integro, com valores, respeitável e que mostrasse a eles que gostar da pessoa do mesmo sexo é algo normal. Não tem nada de absurdo, da mesma maneira que eu tenho certeza de que muitos dos nossos leitores sofreram por serem Nerds, Geeks, ou mesmo diferentes.

O Lanterna Verde, em seu principio é alguém que não tem medo de nada, por isso é uma excelente escolha como personagem modelo dos homossexuais. Já que boa parte do conflito interno entre cada um deles, é enfrentar uma sociedade preconceituosa. Desde pequenos somos bombardeados com estímulos homofóbicos, um dos primeiros xingamentos que nós aprendemos é “viadinho”. Para muitos, ser homossexual é uma das piores coisas que se pode acontecer com qualquer pessoa, pois junto com essa situação, se encontram muitos estereótipos de promiscuidade, “portadores do HIV”, entre outras baboseiras que se foi associando a imagem dos homossexuais.




Em uma das entrevistas ao The New York Post, o escritor James Robinson ele disse que, espera que as crianças e adolescentes que estiverem lendo a HQ, irão perceber que ser homossexual é algo comum. Para ajudar aqueles que estão em um conflito interno (como dito anteriormente a respeito dos modelos), ou até mesmo para aquele garoto que gosta de zoar com todo mundo, que não tem nada de mais em ser gay.

“Alan Scott is super-heroic, he’s super gallant, he’ll die for the earth, he’ll die for its people, he’s everything you want in a hero. I imagine he’s such a Type A character that when he realized he was gay, he was like, ‘Okay, I’m gay, now I’m just gonna go on with my life.’ He’s so accepting of it himself and he’s such a compelling person that the world knows Alan Scott’s gay. He’s such a leader, he’s such a good man, that the Justice League don’t care. And that’s a healthy depiction of a team and how it should be.”

Poucas horas depois do pronunciamento da DC Comics, o grupo “One Million Moms” (Um milhão de mães), postou um “alerta” no facebook dizendo que agora o Lanterna Verde era homossexual. Ao contrário do esperado, boa parte dos comentários eram positivos o que acabou fazendo com que menos de uma hora depois o post fosse deletado. Mas apesar da movimentação online, eles encaminharam uma carta para a DC Comics, dizendo que as crianças em sua maioria tentam imitar os super heróis, suas roupas, atitudes e isso inclui (pasmem) o comportamento homossexual. Que perante a comunidade cristã (sic), homossexualidade é um pecado (sic).




O grande problema é que as pessoas ainda tem muito preconceito com esse tipo de coisa, assim como nas décadas de 50/60 em muitos estados americanos era proibido o casamento entre diferentes raças, e acabavam utilizando passagens bíblicas para comprovar isso. Acho que todos já ouviram isso alguma vez, não foi?


O Psicologo Abraham Measlow, propos que existe uma divisão hierarquica das necessidades humanas. Em que as que se encontravam na parte mais baixa, precisavam ser satisfeitas antes das necessidades de níveis mais altos. Cada um precisa "escalar" uma hierarquia de necessidades para atingir a auto-realização. Maslow define um conjunto de cinco necessidades descritas na pirâmide.

  • necessidades fisiológicas (básicas), tais como a fome, a sede, o sono, o sexo, a excreção, o abrigo;
  • necessidades de segurança, que vão da simples necessidade de sentir-se seguro dentro de uma casa a formas mais elaboradas de segurança como um emprego estável, um plano de saúde ou um seguro de vida;
  • necessidades sociais ou de amor, afeto, afeição e sentimentos tais como os de pertencer a um grupo ou fazer parte de um clube;
  • necessidades de estima, que passam por duas vertentes, o reconhecimento das nossas capacidades pessoais e o reconhecimento dos outros face à nossa capacidade de adequação às funções que desempenhamos;
  • necessidades de auto-realização, em que o indivíduo procura tornar-se aquilo que ele pode ser: "What humans can be, they must be: they must be true to their own nature!" (Tradução: "O que os humanos podem ser, eles devem ser: Eles devem ser verdadeiros com a sua própria natureza).



Pouca gente sabe, mas meus melhores amigos na faculdade são homossexuais. Sou o único homem hetero do grupo, e o mais engraçado de tudo é que eu sou o alvo de piadas frequentes. Mas apesar de alguns serem mais afetados que os outros, todos passaram por preconceito, momentos de negação, até mesmo a automutilação por essa condição que eles se encontravam. Eu admiro a coragem de muitos deles, de enfrentar as pessoas, toda a sociedade. Dar a cara a tapa por ser diferente.
Mas no fundo, não é tudo isso que nós queremos?




 “Quando fores crescido, hás de querer ser feliz. Por enquanto não pensas nisso e é por isso mesmo que o és. Quando pensares, quando quiseres ser feliz, deixarás de sê-lo. Para nunca mais! Talvez para nunca mais!... Ouviste? Para nunca mais. Quanto mais forte for o teu desejo felicidade, mais infeliz serás. A felicidade não é coisa que se conquiste.” José Saramago – Claraboia.


Pra quem quiser uma prévia do que vai ser esse HQ, segue algumas páginas.

Earth 2 issue 2 preview

4 comentários:

  1. Legal, um texto muito bem feito!

    Em primeiro lugar, tenho a opinião que todos devem ser respeitados.

    Fazem poucos meses, assistia a missa e o padre falou que tem em seu circulo de amigos pessoas que são homossexuais e os respeita, assim como estes devem ser respeitados na Igreja Católica, mesmo deixando claro que esta união não é e nunca será aprovada pela igreja.
    Achei interessante compartilhar esta informação.

    Quanto ao herói em questão, a escolha "dele" deve ser respeitada também... porém, eu levarei isto em conta ao escolher um gibi para comprar para meu filho.

    Abraço!

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    1. Bem Juliano, obrigado pela opinião!

      Mas ainda acho que os dogmas religiosos acabam por influenciar e até mesmo doutrinar as pessoas de maneira errada, se fossemos nos basear por textos biblicos por exemplo, você não poderia tocar a sua esposa em período de menstruação. Fazendo isso, você se tornaria impuro.

      O divórcio também não era aceito pela Igreja, mas é comum aos olhos da sociedade ver casais se separando. O que se deve ser muito importante e aplicado é que vivemos em um estado laico. Independente das seitas, igrejas ou adventos religiosos não aceitarem, o que é definido pelo estado tem de ser aceito e queira você ou não.

      Sobre a escolha do HQ, creio que provavelmente deveria estar entre as coleções que o seu filho passe a ler, assim tenho certeza que ele terá um respeito muito maior pelos homossexuais e outras minorias!

      Abraço!

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  2. Você simplesmente entrou na minha mente e mudou minha opinião...

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